"Apagão leva empresas a investir na formação de profissionais de tecnologia. Veja as oportunidades"
Com dificuldade de achar mão de obra especializada, companhias como XP e iFood se unem para treinar pessoas em TI, com prioridade para segmentos vulneráveis Setor terá de 797 mil vagas em 5 anos
Por Raphaela Ribas e Bruna Martins* — Rio
Com a necessidade de 797 mil profissionais de TI nos próximos cinco anos, de acordo com a Brasscom, associação do setor, 20 entidades, entre empresas e instituições, uniram-se para formar sua própria mão de obra de tecnologia de informação.
Encabeçados pela XP Inc. e pelo iFood, o Movimento Tech vai atuar com jovens que ainda estão no ensino médio e na capacitação de desempregados. O foco são os jovens de baixa renda. O objetivo é arrecadar R$ 100 milhões até 2025 e R$ 2,1 bilhões até 2030. Até agora, já conseguiram R$ 5,2 milhões.
Segundo Daniel Knopfholz, vice-presidente de Tecnologia e Inovação do Grupo Boticário, um dos participantes do movimento, os profissionais mais procurados são para desenvolvedor de front-end e back-end, UX designer, segurança da informação e para trabalhar com a nuvem (internet). O funcionários de TI da empresa, nos últimos três anos, passou de 200 para 2 mil.
— Uma vez formados, os alunos vão para um banco de currículo, onde as empresas também publicam as vagas para fazer essa ponte de empregabilidade — explica Gustavo Vitti, vice-presidente de Pessoas e Sustentabilidade do iFood.
Gabriel Santos, VP de tecnologia da XP, esclarece que quem fizer o curso poderá concorrer a qualquer vaga no mercado, não só dos parceiros.
Em geral, os programas de formação para TI são de curta duração e voltados para pessoas em situação de vulnerabilidade social, e para mulheres, negros e trans.
A ideia é trazer maior diversidade e cumprir a agenda ESG (sigla em inglês para meio ambiente, social e governança). Esse público está mais disponível no mercado, justamente por ter menos chances, diz o economista Bruno Imaizumi, da LCA Consultores.
Novas carreiras
Além das capacitações realizadas pelas empresas, algumas são independentes e específicas, como a {reprograma}, que ensina desenvolvimento de front-end e back-end para mulheres em situação de vulnerabilidade, dando prioridade a negras, trans e travestis.
Mil já foram formadas, sendo que 73% delas estão empregadas. Segundo Fernanda Faria, cofundadora e diretora, 15% das alunas são mães, e 75% são negras.
A VTEX conta com sete iniciativas para qualificar pessoas vindas das mais diferentes áreas do conhecimento, assim como a Amazon Web Services (AWS). A empresa de computação em nuvem da Amazon investe na qualificação local de desenvolvedores, alunos e na próxima geração de líderes de TI. A meta é treinar 29 milhões no mundo até 2025.
Já a Stone criou dois programas. O Geração Futuro, por exemplo, atua com 40 jovens que não concluíram o ensino superior, com auxílio financeiro e empréstimo de notebook. Lançado em março, teve 4 mil inscritos.
Imaizumi, da LCA Consultores, pondera que, apesar das intenções sociais de oferecer melhores oportunidades a estes grupos, da agenda ESG e da diversidade que traz para a empresa, o profissional precisa ficar atento ao mercado para não receber salário menor:
— Os programas (de TI) resolvem o problema da empresa a curto prazo para ter mão obra imediata mais barata.
Carolina Prado, head de Comunicação da Intel Brasil e Canadá, explica que há cerca de 45 mil formados por ano, contra 420 mil vagas disponíveis no mercado de trabalho.
— Se uma empresa não investe em tecnologia, ela deixará de existir em poucos anos. Precisamos olhar mais os grupos em vulnerabilidade e mostrar que são bem-vindos na tecnologia.
Prova disso é Úrsula Ariel Souza, de 34 anos. Nascida no Pará, trabalhou durante três anos como faxineira. Na pandemia, Úrsula conheceu o ProgMaria, ONG parceira da Intel. Atualmente, ela trabalha como design de produtos na Ambev, sendo responsável pelas etapas de criação de produtos e por atender aos clientes.
— Fui para o emprego que me acolheu, que já servia a pessoas LGBTQIA+. Eu olho para o passado e lembro de tudo o que eu passei. Hoje, eu faço o que eu amo, tenho meu lar, continuo estudando.
Natural de Campina Grande (PB), Ana Luísa Bandeira, de 23 anos, terminou a graduação em Direito na mesma época em que engravidou. Precisou repensar a carreira, já que o estágio não era remunerado. Decidiu investir em tecnologia, paixão da adolescência:
— Eu pensava que tecnologia era coisa de homem ou de pessoas muito inteligentes e boas em matemática.
Há seis meses, iniciou como desenvolvedora front-end na Performa TI:
— A tecnologia foi minha válvula de escape.
Fonte: O Globo